domingo, abril 17

Plebiscitos sempre me reprovam como brasileiro

 Com a ignomínia do Realengo, entrou em discussão no Congresso Nacional a promoção de um novo plebiscito, ainda este ano, para saber se a população brasileira aceitaria ou não se desarmar. Particularmente, sou a favor do desarmamento, mas é cedo para dizer se a – iniciativa, oportunista, é claro – vai para frente.
Acho consultas assim belas, pela possibilidade de participação direta em decisões, mas assustadoras – por perceber que minhas posições não são a da maioria da sociedade. E olha que não sou um modelo revolucionário, longe disso. Sou um cidadão bastante pacato.
A maioria dos brasileiros, em respostas aos institutos de pesquisa, são contra a eutanásia (o direito do paciente terminal de pôr fim à sua própria vida), defendem a manutenção da lei do aborto sem ampliação para além dos casos de estupro e risco para a mãe, rejeitam a união civil homossexual, são contrários à adoção de filhos por casais do mesmo sexo, querem a redução da maioridade penal, a prisão perpétua, acham que o usuário de drogas deva ser sempre criminalizado e por aí vai. Varia de pesquisa para pesquisa, por exemplo, a adoção da pena de morte nem sempre leva a maioria e divide a sociedade. Fato que, por si, já é uma lástima.
Dizem que falta informação e por isso temos uma sociedade que pensa de forma tão conservadora. Mas informação não basta, caso contrário os mais escolarizados teriam um comportamento mais aberto aos direitos sociais e humanos do que apontam as pesquisas. Isso é questão de consciência, que não se aprende nos bancos de escola, mas no trato com a sociedade, no contato com o “outro”, e com suas diferenças. Não através do filtro dos jornais e das lentes de TVs, mas pelo diálogo direto. E se, mesmo assim, não concordarmos com sua posição, podemos, ao menos, ser tolerantes. E aceitar que as pessoas têm direito à própria vida e ao próprio corpo e que não é com uma sociedade ditatorial e sumária que se resolverão os problemas.
No início da campanha presidencial do ano passado, torci para que algum deles tivesse a coragem de vir a público e defender, sem meias palavras, sem legalismos, sem se esconder atrás de rodeios linguísticos, que defende o direito das pessoas de serem elas mesmas e de poderem usufruir da liberdade de decidir a própria vida. Ao longo do segundo turno, com a onda “Tia Carola Quer Que Você Ajoelhe no Milho”, me vi torcendo para que nenhum marketeiro colocasse na TV imagens de alguma mulher que praticou aborto sendo imolada em praça pública. Ah, a decadência da razão…
Esse é o problema de guiar a gestão da sociedade por pesquisas de opinião e não por um conjunto de medidas programáticas. Verifica-se qual a posição da maioria e ripa na chulipa. Discutir os rumos de uma sociedade é muito diferente de discutir o iogurte, a TV de plasma ou a pasta de dente perfeitos. Há detalhes, filigranas, subjetividades, enfim, pessoas. O uso do plebiscito demanda também um trabalho de conscientização profunda, em que o cidadão saiba realmente o que está sendo decidido e as implicações de sua decisão – e não apenas seguir o que o apresentador falar na TV porque mexe com os nossos instintos mais primitivos.
Em suma, aproveitar momentos de comoção para levantar plebiscitos sempre foi uma faca de dois gumes. Hoje, pode ser útil para um lado, amanhã quem sabe.

Escrito por Leonardo Sakamoto http://blogdosakamoto.uol.com.br/     Ótimo blog .. Indico!

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